A pergunta é capciosa. O aprendizado que crianças e adolescentes brasileiros têm nas escolas deveria ser resultado do tipo de educação a que tiveram acesso? Seria simples, se aprendizado e educação não fossem conceitos abstratos, que variam de pessoa para pessoa, dependem da classe social, da escolaridade , da percepção e, principalmente, da bagagem que cada um carrega consigo. Se cada pessoa atribui valores diferentes para tudo, devido à vivência individual, como generalizar o tema? Portanto, na prática, não existe uma resposta única e segura para a pergunta. Por isso, a questão merece reflexão.
 
Avaliar significa estabelecer parâmetros de qualidade. E a qualidade da educação está ligada ao projeto de sociedade que cada país quer para si. Nesse sentido, torna-se imprescindível a definição dos objetivos e ambições para a educação brasileira. De algum modo, isso já está consolidado em nossa Constituição, mas precisa ser constantemente reafirmado e esclarecido, pois ainda há resistências em cumprir o que determina a lei.
 
Na Constituição, o art. 205 determina que a educação deve buscar o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. A lei diz ainda que a educação é um direito de todos, um dever do Estado e da família e sua realização deve contar com a participação ativa da sociedade.
 
Há grande complexidade nesse artigo, porque ele não define o que deve ser avaliado, mas apenas estabelece os objetivos e atores do processo educacional. Afinal, como saber se uma pessoa foi plenamente desenvolvida?
 
Para a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), o pleno desenvolvimento da pessoa não é uma meta estática que, uma vezatingida, se estabiliza. Pelo contrário. Trata-se de processo dinâmico, que nos persegue ao longo da vida. Sendo assim, o pleno desenvolvimento é alcançado continuamente quando a pessoa satisfaz suas necessidades básicas de aprendizagem.
 
Essas necessidades compreendem tanto aspectos formais ensinados nas escolas, como a leitura, a escrita, a expressão oral, o cálculo, conhecimentos específicos, a solução de problemas, quanto aspectos sociais, que dependem da vida em sociedade para serem transmitidos, como, por exemplo, conhecimentos gerais, habilidades, valores e atitudes.
 
Ainda segundo a Unesco, todas essas necessidades estão submetidas a quatro domínios fundamentais: 1) Aprender a conhecer -
a aquisição do conhecimento propriamente dito; 2) Aprender a fazer - o domínio de competências que permitem aplicar o conhecimento em problemas concretos; 3) Aprender a conviver - as habilidades de convívio pacífico, democrático e colaborativo e; 4) Aprender a ser - dependente das três anteriores e materializa os efeitos do pleno desenvolvimento em cada um, tornando uma pessoa mais feliz e apta aos vários desafios da vida, na sociedade contemporânea.
 
Diante do exposto, é possível afirmar que as avaliações oficiais medem uma parte do pleno desenvolvimento de nossas crianças e adolescentes. Basicamente apenas a parte advindas de suas experiências escolares.
 
Um exemplo é o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), espécie de Copa do Mundo da Educação realizada a cada três anos pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne as nações mais ricas do planeta e alguns membros con vidados, entre eles, o Brasil. Essas avaliações medem o conhecimento em leitura, matemática e ciências. O resultado ranqueia os países de acordo com seu desempenho em cada um dos itens e, quanto menor o resultado, entende - se que maior deve ser o investimento naquele quesito. Após três anos, uma nova avaliação é feita nos mesmos moldes e o ciclo recomeça.
 
Por mais que seja aceita a ideia de que é fundamental avaliar essas três áreas do conhecimento, é preciso reconhecer que elas não representam a totalidade do pleno desenvolvimento de uma pessoa. Mantendo a metáfora do esporte, no lugar de uma Copa do Mundo precisamos de uma Olimpíada da Educação, com várias modalidades educativas e não apenas uma pequena expressão de nossas capacidades e necessidades.
 
Assim, resgatando a pergunta inicial, para determinar o que deve ser avaliado na educação brasileira é necessário produzir novas abordagens que combinem as habilidades escolares com as sociais e pessoais, acrescentando no processo avaliativo temas como colaboração, sociabilidade, curiosidade, ética, cidadania, consumo responsável, gosto pelas artes, respeito aos direitos humanos, entre outros.

Artigo originalmente publicado em 7/7/2014 no jornal Correio Braziliense.
 
Milton Alves Santos é pedagogo graduado pela USP e gerente do Centro de Desenvolvimento Integral da ONG Ação Comunitária do Brasil (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.).
 
 
 

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